RIO - Amiga de Marcelo Yuka, Daniela Broitman começou, em 2004, a
gravar informalmente o cotidiano do músico, sem saber muito bem o que
faria com aquele material. Até que, numa ocasião em que a casa de Yuka
estava cheia de amigos, o artista, sofrendo com dores — sequelas dos
tiros que levou em 2000 e que o deixaram paraplégico —, pediu para todos
saírem para ele poder descansar. Quando a diretora começou a guardar
suas coisas, ele falou: “Não, você fica aí.” Ela ficou. Os dois
começaram a conversar, ela pediu para ligar a câmera e, mais tarde,
vendo a gravação, percebeu que tinha um filme. “Marcelo Yuka — No
caminho das setas”, documentário que brotara naquela tarde de meados dos
anos 2000 e vem sendo trabalhado desde então, chegou nesta sexta-feira
aos cinemas.
— Ali Yuka se abriu, estabeleceu um ponto de confiança forte. É a entrevista na qual ele aparece, no filme, falando que sente dores 24 horas por dia, que a cadeira de rodas parece um caixão — conta a diretora.
A partir dali, a diretora estruturou o filme tendo em mente três facetas de Yuka: o homem, o ativista e o artista.
— O homem é o Marcelo, com seus questionamentos, suas fragilidades, a relação com a família, a questão do corpo, da deficiência. O ativista aparece no trabalho que ele faz nas cadeias, por exemplo. E o artista é o letrista, o que está produzindo seu disco, o que toca no Rock in Rio — descreve Daniela.
Yuka relutou em aceitar ser tema de um documentário. Argumentava que havia pessoas mais interessantes que ele para serem retratadas. E mesmo depois de dar sua permissão e abrir sua vida à lente de Daniela, o músico manteve uma postura de negociação constante de limites:
— Fiquei muito tempo arredio, não sabia que ia ser tão incisivo, tão entrão — brinca. — Pensei que fosse como uma entrevista para um jornal, mas o cinema é prepotente, quer que o som da festa abaixe para o som do filme ficar bom. Em alguns momentos tive que brigar para não roteirizar minha vida. Não quis criar nada especial para o filme, quis que as coisas fossem como elas são.
Do resultado, Yuka gosta especialmente das cenas corriqueiras, com a família, nas quais ele aparece mais humano que herói. Ele fala da dificuldade de ser retratado:
— É um recorte da Daniela, claro, e respeito muito isso. E como todo biografado, tem a coisa do egocentrismo de achar que sua vida não cabe em 90 minutos. Tenho mais humor do que parece ali. Por outro lado, acho que o filme é gentil comigo. Tem o recorte de um lado mais bonito, épico. Meu interesse no filme é mais no lado com minha família, essas coisas. Isso me emociona mais. Mas tem uma cena em que faço um ato em homenagem ao índio Galdino que me emociona muito também, e não tem nada a ver com essa coisa mais íntima.
Na visão da diretora, o filme faz exatamente o oposto da mitificação, ao humanizar Yuka, mostrá-lo ora fragilizado, ora forte — como qualquer pessoa:
— Fiz questão de levá-lo à rua onde ele foi baleado para que ele explicasse como foi. Porque os jornais na época falaram que ele foi ajudar uma pessoa e por isso foi baleado, o que não é verdade. Ele conta que não tentou ajudar ninguém, apenas estava naquele lugar naquela hora, querendo sair. Ou seja, não é o discurso do herói.
— Ali Yuka se abriu, estabeleceu um ponto de confiança forte. É a entrevista na qual ele aparece, no filme, falando que sente dores 24 horas por dia, que a cadeira de rodas parece um caixão — conta a diretora.
A partir dali, a diretora estruturou o filme tendo em mente três facetas de Yuka: o homem, o ativista e o artista.
— O homem é o Marcelo, com seus questionamentos, suas fragilidades, a relação com a família, a questão do corpo, da deficiência. O ativista aparece no trabalho que ele faz nas cadeias, por exemplo. E o artista é o letrista, o que está produzindo seu disco, o que toca no Rock in Rio — descreve Daniela.
Yuka relutou em aceitar ser tema de um documentário. Argumentava que havia pessoas mais interessantes que ele para serem retratadas. E mesmo depois de dar sua permissão e abrir sua vida à lente de Daniela, o músico manteve uma postura de negociação constante de limites:
— Fiquei muito tempo arredio, não sabia que ia ser tão incisivo, tão entrão — brinca. — Pensei que fosse como uma entrevista para um jornal, mas o cinema é prepotente, quer que o som da festa abaixe para o som do filme ficar bom. Em alguns momentos tive que brigar para não roteirizar minha vida. Não quis criar nada especial para o filme, quis que as coisas fossem como elas são.
Do resultado, Yuka gosta especialmente das cenas corriqueiras, com a família, nas quais ele aparece mais humano que herói. Ele fala da dificuldade de ser retratado:
— É um recorte da Daniela, claro, e respeito muito isso. E como todo biografado, tem a coisa do egocentrismo de achar que sua vida não cabe em 90 minutos. Tenho mais humor do que parece ali. Por outro lado, acho que o filme é gentil comigo. Tem o recorte de um lado mais bonito, épico. Meu interesse no filme é mais no lado com minha família, essas coisas. Isso me emociona mais. Mas tem uma cena em que faço um ato em homenagem ao índio Galdino que me emociona muito também, e não tem nada a ver com essa coisa mais íntima.
Na visão da diretora, o filme faz exatamente o oposto da mitificação, ao humanizar Yuka, mostrá-lo ora fragilizado, ora forte — como qualquer pessoa:
— Fiz questão de levá-lo à rua onde ele foi baleado para que ele explicasse como foi. Porque os jornais na época falaram que ele foi ajudar uma pessoa e por isso foi baleado, o que não é verdade. Ele conta que não tentou ajudar ninguém, apenas estava naquele lugar naquela hora, querendo sair. Ou seja, não é o discurso do herói.